A Ética e a Inteligência Artificial em discussão na Lourinhã

O ex-ministro da Justiça, Laborinho Lúcio, deu o mote, com uma intervenção inicial escrita sobre o tema da noite – “Homem = Homem + Circunstâncias” - e a terceira conversa noturna do “Livros a Oeste”, a 16 de maio, teve início com histórias de cada um dos cinco convidados, sobre as mais diversas perspetivas.
Depois houve também um debate sobre a Ética e a Inteligência Artificial, a fazer lembrar o livro “Diálogo em Setembro”, de Fernando Namora, que fala num encontro de literatura em Genebra (Suíça), nos anos 60, em que o tema foi “o robot, a besta e o homem – para uma definição do humano”.
Presidente do Instituto Superior Técnico e autor do ensaio “Inteligência Artificial”, Arlindo Oliveira considera que a inteligência artificial virá a ser um motor do desenvolvimento da espécie humana. No seu livro, o autor antecipa que “as inteligências artificiais não serão apenas nossas parceiras na construção da sociedade do futuro”, mas poderão ser “de certa forma, os nossos descendentes”.
No entanto, há que ter em conta o conceito da ética computacional, como sugeriu o moderador da sessão, João Morales. O que se torna muito complicado quando não existe um código de ética universal. Segundo Arlindo Oliveira, já existem sistemas que tomam decisões com base em princípios éticos, que acabam por ter uma grande influência humana ao analisar de acordo com o que as pessoas decidiram anteriormente.
Nos EUA há sistemas que aconselham os juízes na altura de decidirem se devem ou não conceder liberdade condicional a um preso. Isso motivou uma dissertação de Laborinho Lúcio sobre a prisão perpétua e a pena de morte, para o qual não deve existir qualquer discussão por ser frontalmente contra. “O Estado tem o direito de punir em nome de todos nós, mas há limites éticos e um deles é o facto da punição não poder assentar na violação do valor que é o mais importante, o da vida”, esclareceu.
A propósito de condenações e de crimes, António Tavares, vencedor do Prémio Leya 2015, abordou a forma como se pode considerar que não existe Mal, mas sim que é o Homem que pratica atos de maldade. “Se o Mal é inerente à pessoa humana e não uma entidade, é a própria pessoa que nós temos que mudar”, considera.
António Tavares falou também do seu mais recente livro, “Homens de Pó”, sobre o Verão Quente de 1975 e das pessoas que vieram de África para Lisboa, sem nunca terem estado em Portugal anteriormente. “Essas pessoas vão parar a um estaleiro de construção de estradas, num local sem nome e que tinha tudo a ver com eles, que estavam em busca da sua identidade” depois de saírem de África. Ali, vão vivendo sob o manto de uma poeira que os torna fantasmas e sombras num teatro de mudança, cujo palco é um país que também parece andar à procura de si próprio.
Depois de ter apresentado o seu último livro, “Maré Alta”, durante a tarde na Biblioteca Municipal da Lourinhã, Pedro Vieira foi outro dos convidados da sessão da noite, tendo contado mais pormenores históricos que fazem parte do seu romance, em que foi notória a intervenção crucial de certas pessoas em momentos decisivos. “Há homens que mudam as circunstâncias”, salientou. E é de diversas circunstâncias históricas, mas não só, que se faz este livro, embora sejam “as pessoas comuns a matéria prima do que escrevo”.
O poeta João Rasteiro contou a forma como a circunstâncias foram tão importantes na sua vida, tendo seguido o caminho das letras por causa delas. Natural de uma aldeia a 12 quilómetros de Coimbra, começou a ler livros por causa da Biblioteca Itinerante da Gulbenkian aos seis anos de idade, descobrindo assim a leitura. “Era algo absolutamente mágico para mim”, referiu.