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Ciência e Letras em discussão no "Livros a Oeste"

Ciência e Letras em discussão no "Livros a Oeste"

Na última sessão noturna do “Livros a Oeste”, a 17 de maio, com o tema “O binómio de Newton apaixonou-se – As letras da ciência e ciência das letras”, a conversa fez-se entre cientistas e escritores.
O professor Carlos Fiolhais, que tem sido um grande divulgador da Ciência em Portugal, lembrou a analogia que Álvaro de Campos (Fernando Pessoa) fez entre o binómio de Newton, uma fórmula matemática, e a Vénus de Milo (“O binómio de Newton é tão belo como a Vénus de Milo. / O que há é pouca gente para dar por isso”). “De um lado temos a ciência e do outro a arte, sendo que esta última mexe mais connosco. No entanto, há uma ligação: são as duas dimensões humanas”, referiu. Por outro lado, “quem conhece bem o binómio de Newton, percebe que há ali uma beleza escondida”, como costuma acontecer na Matemática.

Carlos Fiolhais lembrou que existem muitos poemas e textos portugueses que falam de ciência de alguma maneira, de Vitorino Nemésio a Gonçalo M. Tavares. “Algo que começou com Gil Vicente, que tem um dos autos com uma crítica aos médicos da altura”, sublinhou.
A poetisa, cineasta e dramaturga Regina Guimarães, referiu a forma como considera que a Matemática Aplicada permite conhecer alguns dos mistérios do mundo e das pessoas “O que liga a ciência à arte, é que ambas partem de uma interrogação sobre o mistério do mundo”, disse. Regina Guimarães lembrou que uma imagem poética será mais forte quando associada a algo distante.
O escritor e guionista Filipe Homem Fonseca, que nessa tarde tinha apresentado seu último romance, voltou a falar da importância da memória e da necessidade de não fazer tábua rasa do passado, para não ser necessário estar constantemente a partir do zero. Até porque isto permite que haja determinadas certezas que não possam ser colocadas em causa. “A memória é uma sustentação a partir do qual posso colocar novas perguntas, porque senão estamos constantemente a voltar para trás”, afirmou.

Na sua opinião, “estamos a comportar-nos como se estivéssemos de costas para o passado e a esquecer o que aconteceu, só nos preocupamos com o agora”.
Ana Cristina Silva, professora universitária de Psicologia da Linguagem e escritora, editou recentemente o livro “As Longas Noites de Caxias” que conta a história de duas mulheres – uma torturadora e uma mulher que foi torturada durante a ditadura. Um livro que João Morales aconselha os professores a levarem para a sala de aula e discutirem-no com os seus alunos.
Esta obra, é um relato sem precedentes sobre as técnicas macabras usadas pela PIDE para obrigar as suas vítimas a falarem. É baseada numa personagem real, conhecida na Pide como Leninha (Maria Helena Oliveira), e que era o terror entre as mulheres que a ditadura perseguiu.

Neste livro, a autora quis compreender como é que “tão facilmente somos capazes de ser tão violentos” e quais os contextos em que esta violência se manifesta. A escritora explicou que o ser humano nasce com uma predisposição para a empatia, mas, provavelmente, estas personalidades mais sádicas “devem ter algum fusível desligado”.
Numa altura em que estão a surgir de novo os extremismos, Ana Cristina Silva considera importante que a literatura relembre a memória coletiva e os tempos das ditaduras, que foram preenchidos com muita violência mesmo em Portugal. Por isso, também pensa ser importante este livro ser lido nas escolas.